Era uma vez uma escola. Mas não uma escola como outra qualquer.
Era uma vez uma escola. E nela as crianças não passavam sem livros um dia sequer.
Era uma vez uma criança. E por estar numa escola cheia de livros, seu mundo era sempre cheio de esperança.
Era uma vez um mundo. E por ter crianças que devoravam livros, estas imaginavam o universo repleto de aventuras, desafios, descobertas e possibilidades. E, por imaginarem, ele existia.
Pode começar com uma contação de histórias, uma roda de leitura, um clube do livro ou um projeto bimestral. Isso não importa. O que importa é começar! O que importa é trazer para o convívio e para a rotina o hábito de ler; é ter livros à disposição para que não faltem oportunidades e recursos de leitura. Podem ser cartazes, gibis, revistas, livros, tirinhas, contos, fábulas e poesias. O que vale é que os estudantes tenham acesso a recursos literários dos mais variados tipos, tamanhos, gêneros, cores e em mais de um idioma.
E por que deveríamos ter livros físicos na escola já que hoje tudo é digital?
Bem, talvez pensar assim é estar um pouco fora da realidade ou ser generalista demais. A pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, feita em 2020, mostrou que o Brasil perdeu 4,6 milhões de leitores. Um número bem expressivo em um país que tem lutado incansavelmente por oportunidades mais equitativas de vida e por um sistema educacional de alta qualidade para todos. Essa mesma pesquisa mostrou que mais da metade dos brasileiros lê por indicação da escola ou dos educadores. A escola é a porta de entrada a diversas experiências que podem transformar para sempre a vida desses jovens. Das experiências com livros, podemos ter futuros escritores, ilustradores, tradutores e até mesmo roteiristas. Sem contar as profissões que ainda não existem e que podem ser criadas em livros por meio da estimulação da criatividade e de todas as possibilidades que se desdobram no mundo do faz de conta. O universo da leitura é rico em muitos aspectos. A ciência já mostrou que ler estimula o raciocínio, aumenta a imaginação e a criatividade, melhora o vocabulário, estimula a capacidade de concentração e ajuda no processo de desenvolvimento da escrita. Então, por que não oportunizar mais momentos de leitura na escola? Por que não investir mais em livros e materiais diversos de leitura que estejam à disposição dos estudantes? Mesmo vivendo em uma era de avanços tecnológicos que acontecem num piscar de olhos e de termos a possibilidade de acessar mais de mil livros em um único aparelho na palma das mãos, os livros físicos ainda representam uma oportunidade de uso dos sentidos para intensificar a experiência da leitura. Eles auxiliam e orientam o aprendizado e facilitam a concentração, uma vez que já temos um tempo consideravelmente alto na frente das telas.
E esses livros deveriam ser somente no idioma adicional?
Em se tratando de Educação Bilíngue, quanto maior a exposição de qualidade à língua adicional, maior a chance do desenvolvimento consistente da proficiência linguística. Ter um cantinho de leitura ou uma biblioteca com títulos dos mais variados na língua de nascimento e na língua adicional aumenta as chances de maior avanço na fluência nos dois idiomas.
Como incentivar a leitura no idioma adicional?
O primeiro passo para criar o hábito da leitura no idioma adicional é ter à disposição material de leitura na língua de nascimento. O hábito se estende de um idioma para o outro, pois, na Educação Bilíngue, os dois idiomas andam juntos e devem fluir de maneira natural. Mas existem também outras ações práticas que podem ser benéficas para um engajamento mais orgânico dos estudantes no hábito da leitura.
1. Seja um educador leitor
O educador é um dos espelhos dos estudantes. Compartilhe suas leituras com os estudantes e mantenha na rotina momentos de leitura no qual você esteja lendo algo também. Os estudantes apreciam demais perceber que seus educadores são humanos como eles.
2. Inclua tempo de leitura durante as aulas
A sala de aula pode dispor de um cantinho de leitura com materiais adequados para a faixa etária, nos dois idiomas preferencialmente. Os estudantes podem ser convidados a contribuir com livros trazidos de casa para esta biblioteca “particular”. O educador pode criar momentos de leitura direcionados para a sala toda – todos param para ler por um determinado tempo – ou pode deixar liberado o acesso aos livros para os estudantes que terminam as atividades primeiro. Essa é uma excelente maneira de uso útil e direcionado do tempo.
3. Ofereça diferentes gêneros literários
Ler o que se gosta é o começo do hábito da leitura. Todo tipo de livro, desde que adequado à faixa etária, é uma excelente ferramenta. Não se esqueça dos gibis e dos mangás, que fazem parte dessa geração e que são encontrados em vários idiomas. Mas cuidado! É preciso fazer uma curadoria cuidadosa sobre o que deve ou não ficar disponível, respeitando a diversidade e a faixa etária.
4. Dê vida à biblioteca da escola
Se a escola tem uma biblioteca, apresentar e utilizar esse espaço com frequência pode torná-lo familiar aos estudantes, dando força aos movimentos de leitura. Sem contar que dar uma aula ou atividade em um lugar diferente é ótimo para todos. Afinal, o espaço também educa!
5. Faça uso da tecnologia
A tecnologia não é uma vilã quando se trata de leitura. Se ela estiver disponível para todos os estudantes da escola, utilize-a em parceria com editoras que disponibilizam centenas de recursos no formato PDF ou digital e que podem ser usados em vários equipamentos eletrônicos.
6. Tenha auxílio da família
Quando o incentivo vem de fontes múltiplas, as chances de ter um estudante leitor assíduo são bem maiores. Envolva as famílias no processo de leitura. Conscientize-as da importância e da relevância desse hábito e convide-as a participar ativamente das iniciativas de leitura feitas pela escola.
7. Crie um clube de leitura
Quanto mais estudantes envolvidos, melhor. Ter projetos de leitura, com ou sem premiações, pode ser uma excelente maneira de envolver toda a escola em momentos cada vez mais significativos para a criação do hábito de leitura.
Uma reportagem do começo deste ano nos trouxe dados alarmantes: 56,4% das nossas crianças do 2º ano do ensino fundamental não são alfabetizadas. Neste cenário preocupante, incentivar a leitura pode ser uma das ferramentas mais valiosas para garantir o pleno desenvolvimento das habilidades linguísticas das crianças nos dois idiomas. Incentivar a leitura desde a infância é uma das diretrizes da Lei nº 13.696, de 12 de julho de 2018. Então, que tal criar mais momentos de leitura para os estudantes na escola, dando também oportunidade para produções linguísticas orais e escritas depois da leitura, saindo um pouco dos tradicionais momentos de leitura do material didático dentro da sala de aula? Um mundo de possibilidades pode se abrir com mais momentos de ‘era uma vez’.
Autora
Milena Mignossi Ferreira
Assessora pedagógica do Be – Bilingual Education. Formada em Letras – Licenciatura Plena em Português/Inglês. Pós-graduada em Planejamento Educacional e Docência do Superior. Mestre em Linguística Aplicada ao Ensino de Língua Inglesa, pós-graduanda em Neurociência e Educação. Certificação TESOL. Mais de 20 anos de experiência em sala de aula e também em docência, coordenação e formação de educadores em centros de idiomas e escolas regulares, da Educação Infantil ao Ensino Médio.